Vazios



Era uma tarde agradável. Eu estava em meio a amigos. Havia alguma música, comida e bebida (sempre há).  Muitas risadas, algum evento qualquer passando na televisão, não que alguém se importasse já que a cerveja era mais do que suficiente para entreter todos os presentes, até mesmo eu: um não "bebinte".

Foi em algum momento da tarde. Então o assunto sumiu. O silêncio das vozes ausentes tomou conta do ambiente. Só um música leve tocava ao fundo. Todos rapidamente sacaram seus celulares, até os que estavam dentro da piscina, e começaram a deslizar os dedos pelas telas. Alguns gargalhavam, outros apenas se deixavam sorver pela torrente de informações, barulhos e piadas que eram despejadas tela fora.

Percorri com os olhos vários dos presentes. Ninguém mais olhava nos olhos dos outros. A sensação de não ter assunto, ou o fato de estar presente no silêncio do momento, era demais para suportar. A tela trazia a resposta exata e necessária de que todos precisavam.

Apenas as crianças de fato curtiam estar fazendo o que crianças fazem: brincar.

Foi então que meu olhar recaiu sobre uma pessoa. Meu olhar recaiu sobre o olhar daquela pessoa. Um olhar que reconheço muito bem. Que já presenciei tantas vezes no espelho. 

O olhar do vazio de perspectivas

Senti nele(a) transbordar um sopro daquele vazio que eu tanto tinha em mim. Aquele vazio de dias que passavam se arrastando sem sentido por anos e anos. Um fio longo e interminável de dias subsequentes sem razão. 

Não quero me julgar mais ou menos que qualquer outro. Acredito, e apenas, que busco esclarecimento em minhas reflexões. Principalmente, esclarecimento de ideias. Cansei de me preencher com coisas que só ocupavam espaço dentro de mim, mas que de forma alguma saciavam a minha existência.

E foi observando aquele (olhar) vazio que percebi que não me preencho tão facilmente com experiências vazias. A minha mistura hoje exige de mim novas substâncias.

Uma dessas "substâncias" é viver os silêncios, conviver com incômodos e entender que nem sempre posso me divertir. A dopamina infinita cobra o seu preço. A fatura da fartura de divertimento chega para todos.

E é passando por momentos assim de forma consciente, estando presente no momento real, que deixo de alimentar vazios insaciáveis que antes escapavam pelo meu olhar.


Marcel

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Emoldurar

Diálogos

Arrependimentos no retrovisor